Livros: ver para comprar

A capa de uma obra é como a embalagem de um produto: meio caminho andado para vender
 

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As livrarias dispõem os livros em estantes e balcões. São milhares deles
e se destacam aqueles cujas capas são mais atraentes

 
Como dizem por aí, aparência é tudo e a primeira impressão é a que fica. Pensando nisso, as editoras investem pesado na ilustração de suas capas, pois a grande maioria dos leitores leva um livro por conta da primeira imagem que vêem. Nesse cenário editorial, ninguém duvida que uma capa bem-feita pode determinar o sucesso de um livro, assim como uma capa menos caprichada pode espantar os leitores mais exigentes. O mercado está cada vez mais concorrido e, nessa briga, leva a melhor a editora que mais investe, é mais criativa e sabe aproveitar as oportunidades.
“Capa boa é aquela que desperta o interesse das pessoas. Capa ruim é aquela que não transmite mensagem. Muitas vezes a editora tem que mudar a capa de um livro na 2ª edição porque a primeira recebeu muitas críticas e, para não prejudicar, às vezes, opta por mudá-la radicalmente. Para mim, capa boa é aquela que transmite uma mensagem aprofundada do livro”, destaca o presidente da Associação Nacional das Livrarias (ANL), Ednilson Xavier Gomes. “Não tenho dúvidas de que uma boa capa faz o livro vender. Ela é o cartão de visitas e a primeira impressão que o consumidor tem. O livro pode ser de um excelente autor e ter um ótimo conteúdo, mas se a capa não condiz com o conjunto da obra, dificilmente irá chamar a atenção do leitor. É como uma fachada mal-pintada, à primeira vista causa estranheza e talvez você nem entre na casa”, compara o presidente da ANL.
Com a influência que exerce no consumidor na efetivação da compra, a capa é tratada com muita dedicação, afinal, ela é a prova de que a criação não é um simples processo técnico. “O elemento principal de um bom livro é a capa e deve ser sempre muito atrativa, ter bom gosto, estar em harmonia com toda a obra. Possuir uma boa comunicação tanto visual quanto na colocação dos textos que a compõem. Tudo deve estar alinhado e, claro, qualidade acima de tudo. O projeto pode até ser hiperconceitual, mas comercialmente não agrada, e isso acontece muito”, explica o gestor do departamento de Compras da Livraria Cultura, Ricardo Schil, que ali está há mais de 10 anos.
Na opinião do jornalista e editor Quartim de Morais, certamente uma boa capa pode ajudar a vender um livro: “Principalmente porque parte significativa das compras nas livrarias é feita por impulso. E as capas que vendem mais são aquelas que de modo mais eficiente traduzem o conteúdo do livro”, destaca o editor, que acredita acima de tudo que o livro é essencialmente conteúdo. A opinião é compartilhada com a diretora editorial da Editora Planeta do Brasil, Soraia Reis: “A capa é de extrema importância, principalmente nos livros de compra por impulso, afinal, é a primeira interação com quem está comprando o livro”.

 
Criação delicada

O “capista”, profissional que idealiza e faz o design da capa, tem um árduo trabalho em suas mãos: transformar aquele projeto em uma embalagem atrativa, que resuma seu conteúdo e brilhe aos olhos do público. É o conjunto de uma extensa cadeia produtiva e até da participação de especialistas de várias áreas, que precisam trabalhar juntos para chegar ao resultado final.
“A capa é, sim, essencial para vender o livro. É o primeiro olhar do consumidor, então ela deve ser atrativa e dizer para que está ali. Faz parte de um intenso projeto de marketing das editoras e, principalmente, não podem deixar de transmitir informação, que é a sua função”, esclarece Maria Amélia Mello, diretora editorial da Editora Olympio, que há mais de 80 anos edita grandes clássicos da literatura brasileira.
“A qualidade técnica dos capistas agrega valor ao livro e proporciona maior retorno comercial”
Ela dá um exemplo muito claro do intenso trabalho das editoras: “José Lins do Rego é um clássico, tem sua venda garantida, mas, para uma nova edição de suas obras, precisava de uma boa estratégia de marketing. Pesquisamos todas as artes de Santa Rosa e criamos uma capa mais moderna, que identificasse toda uma coleção, mas que não descaracterizasse que se trata de um clássico. Adaptamos o visual para o que é atual para chamar a atenção dos novos leitores, ou aqueles que não conhecem o autor. Há equilíbrio entre nome do autor, da obra e a imagem que vai transmitir seu conteúdo, o que caracteriza uma fácil identificação”.
Para a premiada designer de capas, Moema Cavalcanti, antigamente a capa do livro era somente uma proteção para o seu conteúdo e, atualmente, ela é tratada como uma embalagem que ajuda a vender o produto: “O livro passou a ser considerado um objeto de desejo. Mas nem sempre foi assim. A capa de um livro era apenas uma proteção para o seu conteúdo. Tanto que, na maioria das capas dos livros de texto, só havia o título do livro e o nome do autor. Ainda hoje, os livros franceses e alemães, na sua maioria, têm capas simples e despojadas. Capas coloridas e ‘chamativas’ são uma consequência da sociedade de consumo”, comenta a ganhadora de cinco prêmios Jabuti de Melhor Capa.
Moema atua nessa área desde 1968, quando veio de Recife para São Paulo. Já produziu mais de 1.400 capas e diz que, independentemente da campanha de marketing utilizada pela editora, a ação deve focar o autor e o assunto do livro. “A quantidade de livros postos à venda se multiplica em grandes proporções. Há cada vez mais novas editoras e livrarias”, constata. Apesar da importância que acredita terem as capas, Moema faz uma ressalva: “Há best-sellers com capas horríveis e capas lindas para livros medíocres”.
 

A criação de capas é um trabalho complexo, que exige preparo dos designers
A criação de capas é um trabalho complexo,
que exige preparo dos designers

 

 
Pré-produção

Nos últimos anos, nota-se o grande investimento das editoras em relação a qualidade, diversidade e criatividade das capas de seus livros. Uma grande evolução que trouxe melhorias significativas nas últimas décadas, conforme comenta Quartim de Moraes: “Não apenas relacionadas às capas dos livros, mas ao projeto gráfico em seu conjunto – capa e miolo. Tem a ver também com essa evolução, claro, o desenvolvimento tecnológico. Há um quarto de século, era comum os livros apenas colados, sem costura, desfolharem com o tempo e a manipulação. Hoje isso não acontece mais. Nenhum livro desfolha porque hoje as colas são supereficientes”.
Para se criar uma boa capa, aquela que realmente vai atrair o consumidor, tem que ser passado um bom briefing. A concepção desse trabalho é feito em equipe e tudo tem de estar bem esclarecido: sobre o que trata o livro, qual mensagem a capa vai transmitir, o que estará escrito ou não, informações claras e nenhuma confusão. A estratégia de marketing é definida também neste momento, por exemplo, como será o lançamento, ações nos pontos de vendas e como transformar o imaginário em algo concreto e comunicativo.
Para Moema, a parte mais importante na produção é a discussão sobre o assunto: “Um bom briefing me ajuda muito. Não só saber o conteúdo, a história, o estilo do escritor, mas também para que tipo de leitor esse livro será destinado”.
Para uma boa capa, é primordial a adequação da fonte e a harmonia entre as cores. “É um conjunto de coisas. Às vezes, os autores fazem a capa: Chico Buarque, com ilustrações de Ziraldo; Rachel de Queiroz e as características do Nordeste com xilogravuras; o jogo com o “S” nas obras de Suassuna… São jogadas de marketing que mostram a preocupação da editora em apresentar um bom trabalho, o quanto nos importamos com a aparência e queremos entregar um trabalho de qualidade”, ilustra Maria Amélia, da José Olympio.
Segundo Soraia Reis, diretora editorial da Editora Planeta do Brasil, que publicou o best-seller de Laurentino Gomes, 1808, as capas são previamente escolhidas pelo departamento editorial; em seguida, são apresentadas ao comercial, ao marketing e à direção-geral para, juntos, discutirem a melhor opção para o mercado, levando em consideração o público e o gênero publicado. “A capa é de extrema importância, principalmente nos livros de compra por impulso, afinal, é a primeira interação com quem está comprando o livro”, reforça.

 
A capa ideal

Os critérios para se avaliar uma boa capa são inúmeros e dependem muito de cada pessoa, porque cada uma possui um olhar diferente e, assim, é atraído por coisas diferentes. “A qualidade dos designers brasileiros é excelente. As editoras investem muito e devem criar uma cara para cada obra para que o leitor se identifique. Quem inova nesse universo editorial leva vantagem. Às vezes, um excesso pode atrapalhar e o mais simples vai cair bem melhor. Às vezes, uma capa branca, com o título em relevo também branco, pode ser interessante, dependendo do conteúdo”, diz Ricardo Schil, da Livraria Cultura.
Para Moema Cavalcanti, nem sempre uma mistura de imagens, algo que chama a atenção, é bom: “As melhores capas são aquelas que procuram dizer algo do livro sem, entretanto, contar toda a história dele. Nem sempre colocar imagens, fotográficas ou não, impulsiona a compra. Muitas vezes, apenas sugerir uma situação, com traços mínimos é o bastante. Em minha opinião, considero capas de mau gosto aquelas em que há uma profusão de imagens e um mistura de fontes no lettering, levando o leitor a se ‘perder’ e não conseguir visualizar o título do livro que é o que mais interessa” explica a capista.
“Uma capa abstrata é mais adequada para uma obra de ficção; uma biografia praticamente pede uma foto do perfilado; livros sobre negócios, administração, finanças, marketing geralmente têm capas essencialmente gráficas, muitas vezes all-type; livros infantis não dispensam na capa imagens ricamente coloridas”, descreve Quartim de Moraes. “Eu diria que há um critério subjetivo, puramente estético, e outro técnico, que considera, por exemplo, a adequação da capa ao conteúdo da obra. Talvez a síntese seja: uma boa capa é aquela capaz de reunir qualidades estéticas e técnicas, incluídas nestas a adequação ao conteúdo”, acrescenta.
Uma equação perfeita que deve incluir a pertinência entre o texto e a ilustração da capa e resultar em informações condizentes com o conteúdo. “O mundo oferece um cardápio enorme. Só aqui na Olympio produzimos quase 80 livros por mês. Capa confusa não vende, propaganda enganosa não vende. Alguns tentam ‘mascarar’, mas não adianta. A estética tem que estar de acordo, ter um bom projeto gráfico, boa apresentação de fotos, ilustração. A capa ideal tem que se diferenciar das outras. É importante tudo casar, principalmente qualidade e preço. Por exemplo, lançamos a biografia de Jack Kerouac, por Barry Miles, mas ninguém sabe quem são eles. Só que a obra de Kerouac está em evidência na mídia; então, escolhemos uma imagem de uma longa estrada que vai remeter à adaptação do livro On the Road. Essa primeira imagem convida o leitor a conhecer a vida desse autor”, conta Maria Amélia.
De acordo com os dados de pesquisa Retratos da Leitura no Brasil, realizada entre junho e julho de 2011, pelo Instituto Pró-Livro, o brasileiro lê em média quatro livros por ano, entre literatura, contos, romances, livros religiosos e didáticos. E segundo o Diagnóstico do Setor Livreiro da ANL, é uma realidade que as livrarias se tornaram espaço de convivência para os consumidores. Em busca de um livro, os leitores têm a possibilidade de tomar um café, encontrar amigos e participar de eventos. O inverso também pode ser considerado: ao encontrar um local para tomar um café ou participar de algum evento, o consumidor interessado em produtos culturais acaba por comprar um ou mais livros.
Nessa hora entra o projeto de marketing criado pelas editoras para alavancar determinado livro, ou seja, o consumidor pode levar um livro por impulso e, nesse momento, leva vantagem aquele que tem a melhor capa, aquela que chamar mais sua atenção. “Aqui na livraria, vemos muitas compras por impulso por conta somente da capa. Afinal, são mais de 80 mil títulos em toda a loja e será levado aquele que se destacar entre tantos. O livro deve saltar aos olhos daqueles que o veem”, exalta Schil, da Livraria Cultura.
 

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A criação da capa de 1808, do jornalista Laurentino Gomes, foi estudada em cada detalhe,
com a preocupação de quem produz uma embalagem. No mercado editorial atual, a ausência
de preocupação com a elaboração pode fadar uma obra ao fracasso

 
Fonte: Cristiane Ramos | Negócios da Comunicação
 
 

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